“Beba das águas da sua cisterna, das águas que brotam do seu próprio poço. Por que deixar que as suas fontes transbordem pelas ruas, e os teus ribeiros pelas praças? Que elas sejam exclusivamente suas, nunca repartidas com estranhos. Seja bendita a sua fonte! Alegre-se com a esposa da sua juventude. Gazela amorosa, corça graciosa; que os seios de sua esposa sempre o fartem de prazer, e sempre o embriaguem os carinhos dela” (Pv 5.15-19).
A crise hídrica brasileira tem feito muita gente repensar o uso da água. Recentemente, li que 97,3% da água do mundo é água marinha e imprópria para beber. Dos 2,7% de água fresca, mais de ¾ estão nos dois polos, em forma de gelo. Grande parte do outro quarto fica localizado no subterrâneo profundo, inacessível para o consumo. Assim, apenas 0,36% de toda a água do mundo está disponível em forma potável na superfície da terra. Esta é encontrada em rios, lagos e pântanos. Ainda assim, a poluição e o desperdício estão reduzindo rapidamente até essa pequena porção.
O uso apropriado da água é usado por Salomão como paralelo didático com a finalidade de expor a prática correta de homens e mulheres casados e seu relacionamento conjugal. Assim, o escritor ordena: “Beba das águas da sua cisterna, das águas que brotam do seu próprio poço”. Esse é um chamado à fidelidade conjugal. Nessa figura, a esposa é representada como a água que sacia a sede do seu marido. Um modo mais literal de expor a mesma coisa é dito pelo escritor na frase “alegre-se com a esposa da sua juventude”, ou seja, aquela que o homem tomou para si no passado, sem substituí-la por outra. A tentação de querer saciar os desejos com outras mulheres, além de ser pecado, é também uma grande tolice, já que o pensamento de que outras pessoas têm apenas vantagens e não defeitos é um erro digno dos homens mais insensatos. Por isso, Salomão chama os maridos a olhar para suas esposas como uma “gazela amorosa, corça graciosa”, de modo “que os seios de sua esposa sempre o fartem de prazer, e sempre o embriaguem os carinhos dela” — a linguagem é ousada e explícita, mas apropriada ao necessário apego e deleite do casal entre si.
Se o homem deve beber e se fartar apenas do seu poço, as águas desse manancial também devem ser exclusivamente suas, pelo que o escritor pergunta: “Por que deixar que as suas fontes transbordem pelas ruas, e os teus ribeiros pelas praças?”. Essa pergunta retórica tem a intenção de expor a necessidade de fidelidade também por parte da esposa. Entretanto, o modo como essa afirmação é dirigida aos homens revela a necessidade de cuidado por parte dos maridos em relação às suas esposas, tanto ao serem fiéis como amorosos. O texto, longe de justificar qualquer infidelidade feminina, parece informar que a falta de amor e de cuidado por parte dos homens serve de incentivo para que as mulheres busquem fora de casa o que não encontram em seu casamento. Mas isso é inaceitável, de modo que marido e esposa devem completar a vida um do outro, fazendo com que tais águas “sejam exclusivamente suas, nunca repartidas com estranhos”. Portanto, não se iluda com as enxurradas caudalosas que carregam lama por toda parte, mas valorize e cuide do poço que Deus lhe deu para saciar sua sede e refrescar sua vida, de modo que “seja bendita a sua fonte!”.