“Visto que desprezaram totalmente o meu conselho e não quiseram aceitar a minha repreensão, eu, de minha parte, vou rir-me da sua desgraça; zombarei quando o que temem se abater sobre vocês, quando aquilo que temem abater-se sobre vocês como uma tempestade, quando a desgraça os atingir como um vendaval, quando a angústia e a dor os dominarem. Então vocês me chamarão, mas não responderei; procurarão por mim, mas não me encontrarão” (Pv 1.25-28).
Um amigo de infância, certa vez, me disse que ia subir até a Pedra Grande, em Atibaia (SP), com um grupo de colegas. A caminhada até o topo normalmente leva cerca de três horas a partir do nosso costumeiro ponto de partida. Isso queria dizer que ele não estaria de volta em menos de seis horas e a chuva que começava a se armar não parecia que iria esperar tanto tempo. Eu o alertei diversas vezes, mas ele estava confiante de que voltaria antes do temporal. Eu estava certo. Quando ele chegou, estava com lama até dentro das orelhas, pois escorregou em um ponto crítico da trilha e parou dentro de uma enorme poça de lama preta. Depois que me certifiquei de que ele não estava machucado, tive uma das maiores crises de riso da minha vida. Afinal, eu avisei!
No discurso da Sabedoria aos tolos, ela diz ter uma reação parecida com a minha. Na verdade, duas seções iniciadas com a expressão “visto que” traçam duas consequências à tola rejeição dos alertas e das correções sábias. Assim, a Sabedoria personificada diz aos tolos que, “visto que desprezaram totalmente o meu conselho e não quiseram aceitar a minha repreensão, eu, de minha parte, vou rir-me da sua desgraça”. A diferença entre esse caso e o meu é que, enquanto eu ri da tolice do meu amigo que não lhe trouxe consequências permanentes, a Sabedoria trata de severos males que os insensatos atraem sobre si mesmos, dizendo-lhes: “Zombarei quando o que temem se abater sobre vocês, quando aquilo que temem abater-se sobre vocês como uma tempestade”. É interessante ver esse discurso que repete sua afirmação inicial acrescentando a ideia de uma destruição crescente na expressão “como uma tempestade”.
Sendo assim, é como se fosse o último alerta que a Sabedoria faz no sentido de avisar sobre os perigos de colher o que plantou — isso se parece com o ensino de um escritor posterior que disse que “eles semeiam vento e colhem tempestade” (Os 8.7). Essa mesma figura é repetida, sendo agora bem-associada ao sofrimento, visto que a Sabedoria afirma que rirá dos tolos “quando a desgraça os atingir como um vendaval, quando a angústia e a dor os dominarem”. É claro que um sofrimento assim não pode ser ignorado por quem passa por ele. Desse modo, a Sabedoria prevê que tais insensatos a buscarão, não para se tornar sábios, mas para procurar alívio, no melhor estilo “antes tarde do que nunca”. Entretanto, descobrirão que será mesmo tarde demais, pelo que se lhes diz: “Então vocês me chamarão, mas não responderei; procurarão por mim, mas não me encontrarão”. Portanto, busque a sabedoria enquanto se pode achar. Na verdade, o conselho que a própria Sabedoria daria é “busquem o Senhor enquanto se pode achá-lo; clamem por ele enquanto está perto” (Is 55.6).