“Assim como é inútil estender a rede se as aves o observam, também esses homens não percebem que fazem tocaia contra a própria vida; armam emboscadas contra eles mesmos! Tal é o caminho de todos os gananciosos; quem assim procede se destrói” (Pv 1.17-19).
Certa vez, passei as férias em uma fazenda que tinha como uma de suas divisas o grande rio Paraná. Nunca fui um grande pescador, mas sempre gostei de pescar, de modo que essa não era uma oportunidade que eu pudesse perder. Preparei toda a “tralha” na noite anterior e aguardei com ansiedade. Quando cheguei ao local, minha surpresa foi ver a água extremamente transparente, algo incomum em um rio. Sentei-me sobre um grande tronco caído e fiquei olhando os peixes passarem de um lado para o outro. Achei interessante no começo, até perceber que, se eu via os peixes, eles também me viam. Passei a manhã toda tentando pescar, mas o máximo que consegui foi ficar admirando dois surubins que nadavam tranquilamente sob meus pés, mas que também insistiam em não morder a isca. Era como se zombassem de mim. De qualquer modo, foi um dia inesquecível.
A partir dessa ocasião, sempre que leio esse provérbio, sinto-me menos incompetente, não porque eu tenha pescado algo, mas por saber que mais gente experimentou o mesmo que eu. Salomão falou de um caso semelhante, mas não ligado a peixes. Ele diz que “é inútil estender a rede se as aves o observam”. Como os peixes me viram e não caíram na minha armadilha, esses pássaros também não caíram nas redes preparadas para pegá-los. Essa comparação é usada para mostrar que as armadilhas dos maus também são inúteis para fazê-los prevalecer definitivamente. Esse trecho é a sequência natural dos vv.10-16, nos quais o escritor alerta sobre o perigo dos convites atraentes do mundo. Agora, ele explica as consequências daquela ação, dizendo que “esses homens não percebem que fazem tocaia contra a própria vida; armam emboscadas contra eles mesmos!”. Salomão argumenta com isso que seus esforços, por mais que pareçam efetivos, trarão para eles consequências amargas.
A intenção desses ímpios é exposta nos versículos anteriores, que descrevem seu impulso destruidor (vv.11,12) com a intenção de obter lucro (vv.13,14). Porém, o que parece ser uma iniciativa que lhes trará benefícios, é a razão da sua queda, pelo que o escritor avisa que cair na própria armadilha “é o caminho de todos os gananciosos; quem assim procede se destrói”. Por isso, a ganância que os move é também aquilo que os assola. O que Salomão não explica — e nem tinha como fazê-lo detalhadamente — é a circunstância da queda dos gananciosos, cabendo a cada um uma história diferente. Porém, a julgar pelo ensino geral das Escrituras, há duas instâncias em que essas consequências recaem sobre quem arma emboscadas para os outros, a saber, a justiça dos homens, como intermediários da justiça divina, e o próprio Deus, seja nesse tempo ou no julgamento futuro. Assim, o sábio não pode se deixar dominar pela ganância, nem pelas vias mundanas de saciar suas ambições. Afinal, de que vale preparar a melhor armadilha de caça, mas voltar de mãos vazias para casa? E o “que adiantará ao homem ganhar o mundo inteiro e perder a sua alma?” (Mt 16.26).