“Você diz em seu coração: ‘Quem me derrubará por terra?’” (Obadias 3b).
A segunda metade de Obadias 3 é a sequência natural da descrição da prepotência do coração dos edomitas por causa das vantagens naturais em termos de defesa militar que seu território elevado e rochoso lhes proporcionava, fazendo-os se sentirem imbatíveis e poderosos. Apesar de o versículo como um todo cumprir esse papel em unidade, há uma leve distinção entre a primeira e a segunda parte do texto. Enquanto na primeira metade o Senhor é quem faz declarações dirigidas a Edom, expondo-lhes a condição de perversidade, engano e soberba, na segunda metade Deus dá voz aos edomitas, como que lhes permitindo expor, eles mesmos, seu pecado, o qual não apenas demonstravam em ações concretas, mas que também abrigavam em suas mentes, no campo dos seus pensamentos. Isso fica claro quando esse trecho é introduzido pela frase “você diz em seu coração”, cujo significado, em linguagem mais direta quanto ao pretendido pelo autor, seria “você pensa consigo” ou “você pensa em seu íntimo”. O fato é que Deus sabia o que o povo de Edom pensava de si mesmo e como acalentava seu orgulho interior. E diferente do que muitos esperam ou imaginam a respeito do Senhor, ele se importa, sim, com o que as pessoas pensam, seja bem ou mal.
Mas qual era esse pensamento? O que os edomitas diziam para si era o pedante e soberbo questionamento: “Quem me derrubará por terra?”. Esse ato de derrubar aqui tem um duplo sentido, pois traz a recordação dos lugares altos em que Edom habitava e nos quais confiava, ao mesmo tempo em que forma uma expressão cujo significado é derrotar. Além disso, não se trata de uma pergunta qualquer, ou seja, um questionamento que procura uma resposta. Trata-se de uma pergunta retórica, aquela que faz uma afirmação em forma de pergunta, cuja resposta é a que o interlocutor pretende. Nesse caso, Edom tinha em mente a resposta “ninguém”, ou seja, é um modo de afirmar que “ninguém os poderia derrubar”. Entretanto, eles falharam ao desconsiderar o conhecimento e o julgamento de Deus. A nação pensou que ninguém poderia conquistá-los, mas Deus prometeu derrubá-los.[1] De fato, o versículo todo acusa essa arrogância vinda de um coração enganado. E justamente nesse contexto é curioso notar o papel dos pensamentos que as pessoas abrigam em seu íntimo. Nesse caso, essa reflexão desafiadora e arrogante fez com que o coração do povo se endurecesse ainda mais para o temor a Deus e para a compaixão aos seus vizinhos israelitas, tornando-os mais perversos e soberbos do que já eram.
Sob essa óptica, há aqui um alerta que vale para todos, especialmente nós, servos de Jesus. Os pensamentos que acolhemos em nossa mente podem nos impulsionar para o bem ou para o mal, para a obediência ou para a rebeldia a Deus, para a santificação de vida ou para a mundanização dos nossos hábitos. E Deus se importa com o que pensamos, não apenas pelos resultados desse processo, mas por definir aquilo que valorizamos, aquilo que acolhemos com intensidade em nossa mente, que são valores preciosos para nós, razão pela qual pensamos neles tanto tempo. Afinal, “onde está o teu tesouro, aí estará também o teu coração” (Mt 6.21). No caso dos edomitas, seus pensamentos prepotentes os levaram a agir com crueldade para com os israelitas e completa falta de temor para com Deus. No nosso caso, desviam-nos das verdades e dos propósitos de Deus, aproximando-nos do mundo, dos seus hábitos, da sua complacência com o pecado e do estilo de vida que, longe da santidade, causa repúdio no nosso Senhor. Mas como evitar esse mal na forma de simples pensamentos que abrem portas a tantos males maiores? A Bíblia responde a essa pergunta, instruindo: “Finalmente, irmãos, tudo o que é verdadeiro, tudo o que é respeitável, tudo o que é justo, tudo o que é puro, tudo o que é amável, tudo o que é de boa fama, se alguma virtude há e se algum louvor existe, seja isso o que ocupe o vosso pensamento” (Fp 4.8).
[1] Smith, Billy K.; Page, Franklin S. Amos, Obadiah, Jonah, vol. 19B, The New American Commentary. Nashville: Broadman & Holman Publishers, 1995, p. 183.